15.1.18

As duas últimas inovações na política em Portugal...



 «…tiveram um único autor, o PS e António Costa. Por muito que custe ao PSD, foi o partido rival que as trouxe para a vida política e, em ambos os casos, saiu beneficiado com elas. Refiro-me à abertura eleitoral do PS ao voto dos não militantes nas eleições internas que opuseram Costa a Seguro, e a "geringonça". Nenhuma tinha qualquer precedente sério e a segunda mudou definitivamente o ciclo político e o sistema de alianças, e, mesmo que acabe mal, o mundo à esquerda nunca mais vai ser o mesmo. A primeira foi importada de algumas experiências europeias e verificou-se ser um êxito quando existem candidaturas fortemente competitivas, a segunda foi feita em contraciclo da política oficial da União Europeia.

O PSD ganha em discutir a sua política de alianças no contexto de 2018-19, seja com o CDS, seja com a possibilidade de apoiar um governo minoritário do PS ou vice-versa, mas a sucessão de tabus que o partido vai coleccionando e a discussão simplista e primitiva destes problemas bloqueia essa discussão. Portas percebeu, quando se afastou depois do fim do PAF, que, no contexto pós-troika, ou havia uma maioria absoluta de "direita" ou esta nunca chegava a governar mesmo tendo um dos seus partidos como mais votado. O dilema que até então existia à esquerda foi superado com a solução da "geringonça". Por outro lado, não é de menosprezar a dinâmica relacional que a aliança PS-PCP-BE gera, e que está longe de estar esgotada mesmo que haja metamorfoses no PCP.

Já a mudança do processo eleitoral no PSD para um modelo próximo do que o PS utilizou e que é cada vez mais comum na Europa, tal não só seria possível nestas eleições internas como era desejável. Era expectável que o confronto Rio-Lopes viesse a ser duro e que tivesse todas as potencialidades para mobilizar eleitores e simpatizantes do PSD, que em grande número se têm afastado do partido. As razões por que isso não tenha acontecido são todas más, e o fechamento do partido num aparelho que, fora das autarquias, não tem dimensão nem influência social é um péssimo sinal para o futuro.

O medo da discussão

O que esta campanha eleitoral interna no PSD está a mostrar é o peso crescente de tabus, de matérias que não se podem discutir sob pena não só de um aproveitamento demagógico e eleitoral por parte dos candidatos, como também de uma pseudodiscussão feita de anátemas e esconjuros, sem nada de substantivo para mostrar. Por exemplo, o PSD nunca discute o que fez, nem as orientações políticas do passado, a não ser quando os seus protagonistas já estão mortos, ou perderam completamente o poder político dentro do partido. É o caso de Balsemão, Mota Pinto, Cavaco e Manuela Ferreira Leite.

Sobre Luís Filipe Meneses há um enorme silêncio envergonhado, e sobre Marques Mendes e Nogueira um sentimento de irrelevância. Quanto a Marcelo, a sua posição actual, institucionalizou uma forma de ambiguidade, que impede a discussão do seu interregno. Santana, como é candidato, torna a discussão do seu governo "das trapalhadas" imediatamente instrumental. Mas é Passos que era essencial discutir e é dele e dos seus que vem a imposição de um grande silêncio, que é para Rio um grande óbice. Mas ele aceitou-o, sob a chantagem de Santana e do aparelho "passista", logo a culpa é dele. Colaborou para castrar a campanha eleitoral da discussão que era mais importante ser tida no PSD.

Na verdade, a discussão mais útil era a dos anos de Passos, desde o chumbo do PEC IV ao governo com a troika. Esses anos estão muito menos esclarecidos do que se pensa – por exemplo, há uma ocultação deliberada do que foi "autoria" da troika e do PSD – e é vital discutir o enorme desvio programático e político à história e tradição do PSD em direcção a um partido "de direita" entendido como neoliberal. Muito da crise actual de influência do partido, assim como muita da margem de manobra do PS e da "geringonça" devem-se à herança dos anos de Passos, e sem a sua discussão (do meu ponto de vista, ruptura), o PSD perderá relevância e função.»

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